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Dramas de Primeiro Mundo

Dramas de Primeiro Mundo

03.Mar.18

Vamos falar de endometriose e de adenomiose? Vamos?

Diana M.

Como seguidora de várias mulheres nas redes sociais, apercebi-me que o mês de Março é, em alguns países, o mês da consciencialização da endometriose. E ontem, antes de aterrar na cama, deparei-me com alguns posts no Instagram sobre o assunto e decidi fazer um post neste blog também. Afinal, eu própria tenho endometriose e adenomiose e sei que este assunto não é falado, por vezes é desconhecido pelos próprios médicos e é preciso que mais mulheres saibam que aquilo que têm é uma condição séria que as pode afectar no dia-a-dia e que é real! Não estão a ser mariquinhas, flores de estufa e não é tudo das vossas cabeças.

 

Mas fica já aqui um disclaimer: eu não sou médica, não sou efermeira, não pretendo armar-me em especialista sobre o assunto. O que aqui quero fazer é partilhar o que são estas duas doença crónicas baseando-me naquilo que li, nas consultas com os meus médicos e na minha experiência pessoal. Se acham que este post tem demasiadas coincidências com aquilo que vocês próprias experienciam todos os meses, então ide ao médico e não saiam de lá até se sentirem esclarecidas e ouvidas. Se isso não acontecer, mudem de médico como eu fiz. Não vou dar dicas de medicamentos, tratamentos, cirurgias nem nada do género, se é isso que estão à espera de ler.

 

Incluí um link para o site original de onde tirei todas as imagens e nesses links podem obter mais informação sobre o assunto. No final do post, vou acrescentar mais sites onde se podem informar sobre estas duas doenças.

 

Mas comecemos por uma lição básica de anatomia feminina, porque muitas mulheres não sabem bem que termos se aplicam a quê, e porque isto tem influência na distinção entre endometriose e adenomiose. Preparem-se, vai haver bonecos.

 

utero1.jpg

 (imagem daqui)

 

Olhem que beleza! Isto são as nossas miudezas, que é como quem diz: o útero. Para fins deste post e para ser o mais simples e clara possível, vamos dizer que o endométrio é a parte cor-de-rosa escura e o miométrio é a parte cor-de-rosa clara. O endométrio é o tecido que reveste toda a parede interna do útero. É onde os embriões se instalam depois de serem fecundados, é onde eles crescem e é este tecido que é renovado todos os meses durante a menstruação. Já o miométrio é a parte exterior da parede uterina composto basicamente por músculo, responsável pela capacidade de aumento do útero durante a gravidez.

 

O QUE SÃO A ENDOMETRIOSE E A ADENOMIOSE?

 

endometriose.jpg

 (imagem daqui)

 

A Endometriose, em termos muito simples, é quando pedaços do tecido do endométrio (cor-de-rosa escuro) se alojam em outras partes do corpo. As mais comuns: ovários, ligamentos que sustentam o útero, bexiga, intestinos, espaço entre o recto e a vagina, ureteres e rins.

 

 

Adenomiose.png

 (imagem daqui)

 

A Adenomiose é quando pedaços do tecido do endométrio se alojam nas paredes do miométrio (cor-de-rosa claro), provocando um espessamento e inchaço do mesmo.

Eu, como sou uma mulher muito especial, linda e maravilhosa, tenho as duas. O meu útero e órgãos envolventes são, portanto, uma espécie de zona de guerra.

 

SINTOMAS

 

Agora vamos aos sintomas. Primeiro, variam de mulher para mulher. Há mulheres que têm dores ligeiras, há mulheres que nem se conseguem levantar da cama. De qualquer forma, a mensagem a reter é: se têm dores menstruais, incapacitantes ou não, que vos deixam desconfortáveis, de rastos e impossibilitadas de fazerem coisas mundanas do dia-a-dia e que parecem afectar outras funções corporais, não vos deixem que digam que é normal. NÃO É NORMAL TER DORES! Então, mas que dores podem dar?

 

Estas dores podem manifestar-se antes, durante e depois da menstruação. No caso da Adenomiose, os principais sintomas são o inchaço abdominal, as cólicas menstruais fortes, aumento da quantidade de fluxo menstrual, prisão de ventre e dor ao evacuar e dores durante as relações sexuais. Na Endometriose os sintomas dependem dos locais onde têm tecido endometrial. Por exemplo, se o tiverem no intestino ou no reto, é natural que também tenham prisão de ventre, dor ao evacuar e sangramento rectal. Se houver na bexiga, pode haver dor acima do osso púbico, dor a urinar e, por vezes, haver sangue na urina também. Por vezes pode ocorrer sangramento fora do período menstrual, conhecido como spotting, embora este não seja sinónimo de endometriose ou adenomiose. O spotting pode ter outras origens, embora seja comum para quem tenha uma das condições de que estou a falar aqui. Acho que vale a pena referir, embora não me vá alongar muito porque não tenho conhecimento suficiente sobre isso, que a endometriose pode comprometer a fertilidade da mulher, causando problemas na altura de engravidar. Muitas mulheres descobrem que têm endometriose, precisamente, quando têm dificuldade em engravidar e começam a fazer exames. Embora endometriose não seja sinónimo de infertilidade, a verdade é que pode dificultar todo o processo.

 

EXPERIÊNCIA PESSOAL

 

Eu acho que tive umas três ginecologistas antes de acertar. Todas me diziam que era normal ter dores menstruais, acnselhavam-me a tomar um ben-u-ron ou um brufen e que tudo ficava bem. Só que não! Entretanto, quando comecei a ter consultas com a minha actual ginecologista, contei-lhe a minha história toda outra vez e eis que ela diz: "Hum... isso não é normal. Vamos fazer uns exames." Acho que foi a primeira vez que fiquei feliz por ir fazer exames. Com ela fiz análises ao sangue e ecografias (mais abaixo falo melhor disso) e depois encaminhou-me para um colega especialista em endometriose com o qual fiz a ressonância magnética (que me detectou, nomeadamente, um útero menor do que o normal, inclinado para trás mais do que o normal, e algo com o melhor nome de sempre: um útero unicórnio).

 

Em termos de sintomas, no meu caso, eu incho ao ponto de não conseguir apertar os botões das calças de ganga e pareço que estou nos primeiros meses de gravidez. Mesmo tomando a pílula o meu período dura à volta de 7 dias, tenho imensas cólicas que não passam com um simples ben-u-ron ou Brufen 200. Ou Brufen 400. Aliás, se eu pudesse ficar na cama em posição fetal durante esses dias, seria o ideal. Começo a chorar baixinho dentro da minha cabeça sempre que penso que tenho de ir à casa-de-banho fazer o nº2, porque tenho dores horríveis e passo lá largos períodos de tempo (já que estamos assim a partilhar informação aqui que ninguém nos ouve). Para terem uma noção, há alturas em que não sei se estou a ter cólicas menstruais ou cólicas intestinais. Também tenho dores no osso pélvico quando vou fazer xixi e passo a vida cansada.

 

Se tudo isto se passar convosco, têm de ir ao médico! Procurem um ginecologista que, depois de vocês lhe descreverem os vossos sintomas, vos diga "ok, isso não é normal, vamos fazer exames". E que exames? Eu comecei com uma simples análise ao sangue a valores específicos: a proteína C-reactiva (um valor elevado revela um processo inflamatório em curso) e CA125 (é um marcador tumoral que podem ajudar a diagnosticar a endometriose mas não só: também cancro do útero e do ovário, doença inflamatória pélvica, entre outros). Para além de análises ao sangue, fiz as ecografias normais (pélvica e endovaginal), bem como uma ressonância magnética à zona pélvica. E apesar de todos estes exames ajudarem a perceber se a mulher pode ou não ter endometriose e/ou adenomiose, só há uma forma de as diagnosticar a 100%: através de uma video-laparoscopia. Nesta cirugia, para além de se conseguir identificar os tecidos do endométrio noutros locais do corpo, estes são imediatamente removidos. No entanto, uma vez que estas são doenças inflamatórias, sempre que menstruamos o processo volta de novo.

 

Eu não fiz a cirugia. O conselho do meu médico no meu caso específico (não tomem isto como regra geral, cada caso é um caso!), baseando-se nos meus sintomas e queixas, nos exames, e na sua própria observação enquanto ginecologista, foi que não valia a pena operar porque eu podia controlar isto de outra forma e, até agora, tem resultado. Mudança de pílula para uma com mais progestina, faço menos interrupções nas pílulas, ou seja, só menstruo de 4 em 4 meses, ou às vezes de 5 em 5 meses (não, não há risco para a saúde da mulher não menstruar quando está a tomar a pílula sem interrupção), quando menstruo ando sempre munida de anti-inflamatórios e analgésicos. 

 

A mudança de pílula e as menstruações mais espaçadas têm, de facto, ajudado, uma vez que quando chega a essa altura, as minhas queixas não são tão severas como quando eram no início. Sei que isto faz confusão a muita gente, mas é recomendação do médico, tem resultado e não faz mal nenhum. 

 

Esta é a minha história e perturba-me saber que há imensas mulheres que sofrem sem saber, que há médicos que não sabem diagnosticar estas doenças porque se instalou o mito de que ter dores menstruais é normal e "nós temos de nos aguentar à bomboca porque a vida não é fácil e temos pena". Eu cheguei a ter ataques de ansiedade porque sabia que na altura X ia menstruar e ia-me custar horrores, antes de saber o que tinha. Se pudesse, não saía de casa nessas alturas. Agora as coisas estão melhores e consigo entender o que tenho e agir com conhecimento. Espero que todas nós consigamos exigir o direito de sermos ouvidas e levadas a sério quando dizemos que algo nos está a afectar e que não achamos normal. É preciso falar sobre isto, é preciso informação, esclarecimento, partilha para que nenhuma mulher sofra em silêncio.

 

E como o post já vai longo, ficam aqui alguns links que podem consultar se quiserem ter mais informação sobre o assunto. E, já agora, partilhem as vossas histórias na caixa de comentários!

Endometriose

EndoPelvic

Adenomiose

Exames de Diagnóstico

Adenomiose e Infertilidade

 

Edit: Há um documentário sobre Endometriose chamado "Endo What?". Fica aqui o trailer.

marco-endopelvic.jpg